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Concurso do TJSE confirma que técnico judiciário não é mais nível médio

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Cerca de 33 mil pessoas se inscreveram para fazer o concurso do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), no último dia 15 de outubro. Teoricamente, qualquer pessoa com formação de nível médio poderia responder as questões elencadas na prova de técnico judiciário. A realidade, no entanto, foi que o concurso de técnico, em 2023, cobrou o maior percentual de questões de conhecimentos específicos de nível superior da história do TJSE, 71%; e acabou com disciplinas de conhecimentos gerais, raciocínio lógico e informática, que eram compatíveis com nível médio. O concurso carregado de conteúdo programático de bacharelado não deixa mais nenhuma dúvida que o TJSE quer cortar, pelo nível superior, a massa de trabalhadores inscrita.

Do total de 70 questões, apenas 20 foram de disciplina de nível médio, Língua Portuguesa, equivalente a 28,5% da prova. As outras 50 questões, equivalentes a 71,5% da prova, foram extraídas de conteúdo programático composto por disciplinas de nível superior: Legislação Específica; Administração; Direito Constitucional; Direito Administrativo; Direito Penal; Direito Civil; Direito Processual Civil; e Direito Processual Penal.

O percentual de questões de Direito (71,5%) foi o maior da história dos concursos no Judiciário sergipano. Nos concursos de 2004 e 2009, foram 62,5% das questões de conhecimentos específicos em Direito. No concurso de 2014, 58,3% das questões eram de conhecimentos específicos em Direito; nesse penúltimo concurso, o Sindijus já alertava a incompatibilidade dos conteúdos e requereu o ajuste do edital ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que fez vista grossa.

E não há o que se falar de “noções de direito”. As questões específicas de Direito passaram longe da letra da lei, geralmente aplicada nos concursos mais simples de nível médio. O que se viu foram questões interpretativas, complexas, que exigiam a análise dos candidatos e conhecimento profundo da legislação.

O apetite da gestão do TJSE em recrutar novos técnicos judiciários formados em nível superior foi explícita, ao cobrar dos candidatos a técnico uma quantidade de disciplinas de nível superior maior do que a quantidade de disciplinas específicas, da respectiva área de nível superior, cobrada dos candidatos a analista judiciário. Na prova de técnico, foram cobradas 50 questões de Direito e Administração. Nas provas de analista, foram cobradas 30 questões, respectivamente da área, como arquivologia, contabilidade, designer, engenharia, medicina etc.

 

NS dos Técnicos

Contra a farsa do nível médio no TJSE, os técnicos judiciários, através do Sindijus, há vários anos reivindicam o reconhecimento do nível superior. Uma das reivindicações prioritárias da categoria é a mudança do nível de escolaridade para investimento no cargo de técnico, de médio para superior.

O coordenador de Formação Sindical do Sindijus, Raul Laurence, que é técnico judiciário e professor, explica que a tese do sindicato está testada e confirmada. O cargo de técnico judiciário – desde o edital do concurso até às tarefas que são desempenhadas nos fóruns – exige conhecimentos de nível superior. O concurso de 2023 comprova que é impossível concorrer ao cargo com conhecimentos de nível médio. Os candidatos, para ter chance, devem ser formados em nível superior ou se apropriar do conteúdo em cursinhos preparatórios que resumem o conteúdo ensinado nas faculdades.

“Uma pessoa pode estudar com professores de engenharia mecânica e aprender a fazer uma máquina. Outra pode estudar com professores de jornalismo e conseguir fazer uma matéria jornalística. Mas o fato de aprender esses ofícios fora da faculdade não significa que essas disciplinas deixaram de ser conteúdos de cursos de nível superior,” explica Raul Laurence.

“No caso do TJSE, onde para exercer o trabalho de técnico, que atualmente a movimentação processual é o principal, são necessários conhecimentos jurídicos, não se pode dizer que o concurso exigiu um ‘curso técnico em direito’ de nível médio, pois esse curso técnico não existe no edital. Foram exigidas disciplinas que são lecionadas em instituições de educação superior ou em cursos preparatórios, que são os mesmos que fazem a preparação dos candidatos para a prova da OAB, que, logicamente, em nada difere do conteúdo do curso superior de Direito,” defende o dirigente do Sindijus.

O comportamento anacrônico da gestão do TJSE, que ainda foi adotado nesse concurso, está em desacordo com a evolução natural do trabalho e dos serviços públicos em outros órgãos, que já transformaram a escolaridade de cargos de nível médio para nível superior. Alguns exemplos nacionais e estaduais: técnico judiciário nos Tribunais Regionais Federais; técnico judiciário no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte; policiais civil, militar e penal em Sergipe; professores em Sergipe; fiscal de tributos da Secretaria da Fazenda de Sergipe; técnico de controle externo do Tribunal de Contas de Sergipe. Até mesmo o próprio TJSE já transformou a escolaridade dos cargos de oficial de justiça e escrivão de 1ª entrância, que eram nível médio e, a partir de 1996, passaram a ser nível superior.

 

Mudança consensuada

A boa expectativa é que o nível superior dos técnicos judiciários seja reconhecido em breve, já que a mudança da escolaridade do cargo obtém apoio desde o início da atual gestão do TJSE.

Em reunião ocorrida no dia 10 de abril deste ano, com a direção do Sindijus, o presidente do TJSE, Des. Ricardo Múcio, manifestou apoio a mudança, na perspectiva de qualificar, ainda mais, o Tribunal no futuro. “Essa é uma forma de qualificar o próprio Poder Judiciário. Eu achava que para esse concurso já constava a exigência do nível superior para técnico, esse era um fato que eu não sabia, pois eu peguei essa questão do concurso e minha posição foi de acelerar. Não dava tempo de estudar tudo, mas eu concordo com isso aí.”

Realista, o presidente do TJ alertou a dificuldade de fazer tal mudança com um concurso público em andamento, mas defendeu a abertura da discussão. “Nesse [concurso] não dá pra fazer mais, mas se já fizer um estudo na minha gestão, deixando aos próximos concursos que, para o técnico, tem que ser nível superior, já atenderia vocês. Mesmo que não fosse comigo, mas no próximo tem que ser. Olhe, contem comigo nessa causa". E Múcio ainda garantiu: "Agora, essa luta também é minha!”.

Desde então, nos diálogos ocorridos entre a direção do Sindijus e a Presidência do TJSE, ficou consensuado o compromisso de encaminhar a mudança normativa após a realização do concurso, recém realizado.